quarta-feira

Episódio 6

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Ele estava lá, a olhar para ela, sem dormir, tomar banho e sem comer nada de jeito há duas semanas. O corpo dela, suspenso na maca, agarrado a máquinas e soros, e ela ouvia e sentia, inconscientemente, a música que ele tinha posto, para a manter viva. "No I don't wanna battle from beginning to end; I don't wanna cycle, recycle revenge; I don't wanna follow death and all of his friends."
Só ele lá tinha ficado sem arredar pé. Os pais dela, a amiga, e agora também o irmão dela, tinham ido comer, dormir, tomar banho, a casa. E ele lá ficava. Dia e noite. Ao lado dela. Ao fim de duas semanas, com a barba por fazer e o cabelo desgrenhado, foi finalmente convencido a ir a casa dela tomar banho e comer qualquer coisa quente e que o alimentasse, e não o pão e água que havia sido habitual.
- Vem a nossa casa. Tomas banho e eu faço-te qualquer coisa para comeres - disse a mãe dela.
E ele disse que não, e insistiu, mas ela foi mais persistente que ele. Até porque ela tinha claramente mais forças que ele.
- Eu fico cá, com ela - disse o pai dela.
E lá foi ele, sem imaginar que seria ao fim de duas semanas que ela iria acordar. Estava ele a tomar banho e a mãe dela bate à porta da casa-de-banho.
- ..., ela acordou!
Ele desligou a água, ainda com um pouco de shampoo no cabelo. Secou o cabelo rapidamente e enrolou-se na toalha. A mãe dela bateu à porta.
- Posso? - após resposta afirmativa entrou - acho que isto te serve. É do irmão dela, mas parece-me que é da roupa maior que ele tem.
- Obrigado.
Vestiu-se num ápice, e precipitou-se para a porta da saída.
- Não comes nada? - questionou-o a mãe dela, com um sorriso de quem já sabe qual vai ser a resposta.
- Não.
Abriu a porta, desceu as escadas a correr, dirigiu-se para o carro da mãe dela, esperou que esta o abrisse, e entrou rapidamente.
A ânsia era tanta. O corpo dele tremia todo, de alto a baixo. Ontem ele perguntava-se quanto mais tempo iria ter que esperar para ela acordar, para lhe sorrir, e ele abraçá-la como quem abraça o mundo, e depois dizer-lhe que estava tão feliz por ela estar bem. Sim, porque ele sabia que ela ia acordar. Porque ele não a podia perder. Não como no pesadelo de há umas semanas.
Chegou ao hospital, entrou, comprou umas orquídeas e partiu para o quarto onde ela estava. Entrou., sem fazer barulho. O irmão dela e o pai encontravam-se junto a ela. A amiga também estava lá, a sorrir-lhe. E ele saiu um pouco. E ficou lá fora, a ver aquele momento. Entretanto chegou a mãe.
- Não entras?
- Já entro. Vá entrando, que neste momento ela precisa da família.
E a mãe dela obedeceu, então. E a primeira coisa foi dizer à filha que ele estava lá fora. Entreabriu a porta e disse-lhe:
- Entra. Ela quer-te aqui. Agora.
E ele entrou, com as orquídeas escondidas atrás das costas, com um sorriso de dentes bonitos e direitos. Um sorriso que dizem ser de orelha a orelha. Mostrou-lhe as flores, pousou-as numa das cadeiras e abraçou-a. E disse-lhe:
- Ai de ti se me deixasses. Ai de ti se partisses sem mim.
E ela sorriu-lhe, e abraçou-o mais do que sempre.

1 comentário:

Flienire disse...

cute cute cute cute *-*

tinha saudades de ler os teus textos (: