segunda-feira

Short story number two - Time to turn into dust

Ela olhava-o especada, petrificada, com o cabelo à frente dos olhos. Ela via algo que queria ver todos os dias da vida dela. Ela via o amor da sua vida, que vestia fato e gravata, pela primeira vez na sua vida. Com o cabelo todo despenteado, lá estava ele, mudo, surdo, cego, à espera que ela dissesse alguma coisa. Ela não conseguiu falar, e soltou apenas uma lágrima. A lágrima rolou pela sua face rosada, e caíram sobre os sapatos do seu amado. Ela olhou uma, e outra, e outra vez. Acenou. Ele não lhe dizia nada. Ela chamou-o. Ele parecia surdo. Ou mudo. Então acenou outra vez, mas nada. O outrora surdo ou mudo voltara a ser cego. Então, ela agarrou-se ao casaco dele. Puxou-o para ela. Ele parecia um saco de ossos. Ou talvez um boneco. Ela soltou um: "Não estou a gostar da brincadeira, porra!". Mas ele continuou a não responder. A agir como se fosse uma marioneta. Então pegou na guitarra. E começou a cantar e a tocar para ele. Porque eles se tinham conhecido por causa da música. Sempre foi a música que os uniu. E cantou a música que ele mais gostava. E ele nada. Cantou uma, e outra, e outra vez. Quando começou a ficar rouca, forçou ainda mais a voz. Quando já não conseguia falar sequer, encostou-se ao caixão e murmurou o mais alto que conseguiu, mas não o suficiente para que alguém ouvisse para além dele: "I love you, but now it's time for you to turn into dust". E abraçou-o uma última vez. E virou-se para o lado oposto. Os familiares, amigos, conhecidos, e até aqueles que lá estavam só porque sim, ou porque queriam despedir-se dele porque ele merecia, pela vida que havia vivido, embora curta, choravam com Teresa, enquanto ela se afastava do seu noivo.
- Enterrem-no de uma vez por todas - disse, friamente.
150 pessoas na igreja levantaram-se para fechar o caixão e levá-lo. Mas apenas o seu pai, o irmão e o pai de Teresa e o seu melhor amigo se dirigiram ao caixão. As restantes 146 pessoas dirigiram-se lentamente, pé ante pé, para a rua, com Teresa. E acompanharam-na até ao cemitério.
Quando chegaram à cova, e estavam prestes a enterrar Pedro, Teresa exclamou "Esperem!". Abriu o caixão, e juntou ao seu amado a sua guitarra. Fechou o caixão e disse: "Já podem".
Enquanto os coveiros preparavam Pedro para se juntar a tantos outros que ali jaziam, Teresa deixou uma folha de papel escapar pelos seus dedos. Uma amiga de ambos os noivos aproximou-se da pré-campa de Pedro e conseguiu ainda ler "I've been roaming around always looking down at all I see" no cimo da folha e "And now it's time to leave and turn to dust" no fundo.

1 comentário:

Di disse...

Perfeito, joão.
Perfeito.